sexta-feira, 12 de julho de 2013


Estava escrito nas estrelas ou outras cartas de marinhar. Nas essências do pensar e nos recantos escuros dos medos: teria de partir! Era esse o seu destino reencontrado, a sua vocação imposta. Partir!
Não era um partir qualquer. Era um partir sem destinos, sem vontades, sem rumos. Simplesmente um partir de quem cumpre, não o sonho, mas um pesadelo. Assim estava escrito! Assim se cumpria!
Tinha tido, por breves instantes, muito breves como convém aos instantes, a ilusão da chegada ao pomar das macieiras sagradas com seus ramos de prata. A ilusão tivera-a quando bebeu a água da fonte sagrada dos corpos. Aquela bebida de que são feitos os sonhos e se constroem os homens. Tinha pensado o porto de chegada, porto seguro, quando encontro a calma no mar límpido e castanho dos seus olhos, que o mar também pode ser castanho quando assim tem de ser.  Quando imenso e cristalino e profundo e misterioso e tantas outras coisas que não aprendera.
Tudo estava escrito contudo. Desde a bruma dos tempos. Tinha de partir.
Não mais valeria os tempos em que lançou ferro naquele peito, em silencio, sem gritos de anunciação.  Porque também a chegada estava escrita...desde a bruma dos tempos. Tudo está escrito! Tudo é escrito. Como se as palavras se nos moldassem os caminhos e a sua ausência fosse a verdadeira visão do deserto.
Já não importava mais que à memória, as horas ganhas ao tempo de solidão em silêncios gritados aos abraços. Em que aquele gosto doce se lhe colou ao corpo e á pele com seu. Em que o som dos gemidos se confundia com o gritos das gaivotas da praia e em que a seda daquele peito era uma extensão natural da sua mão. Já não importava que tivesse aportado, ancorado e naufragado e amado com os cincos sentidos do corpo mais todos os que a alma inventa. Tinha de cumprir o destino e partir.
Haveria de empacotar os despojos com o mesmo zelo com que, tantas vezes tinha empacotado a vida, naquela rotina que conhecia e que teimava em querer esquecer. Procuraria os mapas e instrumentos de navegar guardados algures debaixo da pele ressequidas de tantos sal...de tanta água. Haveria de se preparar pois tinha de partir.
Para o caminho não levaria mais que um punhado de sonhos que razão teimara em matar. Os que tinha conseguido salvar. Não mais que um ou dois para que o lastro se lhe não aumentasse a barca e se afundasse...mais do que necessário. Depois levaria também os unguentos e remédios para as cicatrizes da viagem e para aquela que tinha a forma de um beijo.
Assim estava escrito tinha de partir Não que o tivesse escrito ele. Não que o tivesse sequer sabido ler. Somente conhecia, com a mesma sabedoria de que são feitas as ilusões! Com a mesma dor de que é construída a saudade.

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