Estava escrito nas estrelas ou outras cartas de marinhar.
Nas essências do pensar e nos recantos escuros dos medos: teria de partir! Era
esse o seu destino reencontrado, a sua vocação imposta. Partir!
Não era um partir qualquer. Era um partir sem destinos, sem
vontades, sem rumos. Simplesmente um partir de quem cumpre, não o sonho, mas um
pesadelo. Assim estava escrito! Assim se cumpria!
Tinha tido, por breves instantes, muito breves como convém
aos instantes, a ilusão da chegada ao pomar das macieiras sagradas com seus
ramos de prata. A ilusão tivera-a quando bebeu a água da fonte sagrada dos
corpos. Aquela bebida de que são feitos os sonhos e se constroem os homens.
Tinha pensado o porto de chegada, porto seguro, quando encontro a calma no mar
límpido e castanho dos seus olhos, que o mar também pode ser castanho quando
assim tem de ser. Quando imenso e
cristalino e profundo e misterioso e tantas outras coisas que não aprendera.
Tudo estava escrito contudo. Desde a bruma dos tempos. Tinha
de partir.
Não mais valeria os tempos em que lançou ferro naquele
peito, em silencio, sem gritos de anunciação.
Porque também a chegada estava escrita...desde a bruma dos tempos. Tudo
está escrito! Tudo é escrito. Como se as palavras se nos moldassem os caminhos
e a sua ausência fosse a verdadeira visão do deserto.
Já não importava mais que à memória, as horas ganhas ao
tempo de solidão em silêncios gritados aos abraços. Em que aquele gosto doce se
lhe colou ao corpo e á pele com seu. Em que o som dos gemidos se confundia com
o gritos das gaivotas da praia e em que a seda daquele peito era uma extensão
natural da sua mão. Já não importava que tivesse aportado, ancorado e
naufragado e amado com os cincos sentidos do corpo mais todos os que a alma inventa.
Tinha de cumprir o destino e partir.
Haveria de empacotar os despojos com o mesmo zelo com que,
tantas vezes tinha empacotado a vida, naquela rotina que conhecia e que teimava
em querer esquecer. Procuraria os mapas e instrumentos de navegar guardados
algures debaixo da pele ressequidas de tantos sal...de tanta água. Haveria de
se preparar pois tinha de partir.
Para o caminho não levaria mais que um punhado de sonhos que
razão teimara em matar. Os que tinha conseguido salvar. Não mais que um ou dois
para que o lastro se lhe não aumentasse a barca e se afundasse...mais do que
necessário. Depois levaria também os unguentos e remédios para as cicatrizes da
viagem e para aquela que tinha a forma de um beijo.
Assim estava escrito tinha de partir Não que o tivesse
escrito ele. Não que o tivesse sequer sabido ler. Somente conhecia, com a mesma
sabedoria de que são feitas as ilusões! Com a mesma dor de que é construída a
saudade.
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