quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Ilha de Bruma

Subiu as veredas verdejantes com as certezas que se têm quando o sol nos acolhe e a vida nos sorri. Não se sentia Príncipe mas tão-somente aquele a quem tinha sido pedido um sorriso e um reencontro. Subia a ladeira observando o verde e as flores e as cousas que se lhe saltavam ao entendimento. Sentia-se há muito tempo parte daquela natureza, adoptado por ela e seu devedor enquanto hóspede da ilha. Sentia as suas gentes como a continuação da lenda que invoca místicos reinos perdidos e que ele teimava em encontrar.
O edifício ia surgindo pouco a pouco com a timidez de se impor na paisagem, como se dela não fizesse parte. Perguntou-se quantos pés tinham já subido aquele pequeno morro ignorando, pelo hábito de subir, toda a alva luz que no verde reflectia ou dele era emanada.
A porta principal aberta convidava á entrada. Não de um plebeu mas de uma corte não decadente. À falta de melhor opção decidiu esperar por ela naquele hall revestido de quadros que retratavam outras viagens de outros tempos, mal sabia o quão similar era a sua própria caminhada com aquelas retratadas. Também ele tinha vindo de alem mar aportando, anos antes, naquelas terras de basalto aparentemente frio, naquele chão, muitas vezes cor do sangue de quem o desbravou. Também, em seu tempo se tinha enamorado de vulcões e lagoas, também sua memória era e iria ser mais fruto daquela terra.
Sentiu os passos dela trás de si, ou somente a tal impressão de um olhar que nos observa até a alma, á porta viu-a surgir com a luz reflectida naquele rosto de menina onde um supremo pintor tinha pintado a graça e cor daquele dia de Primavera. Era a contemporânea continuação dos quadros que admirava.
Ela surgindo como de surpresa atirou-se por instinto num abraço sentido e, inesperado mas prontamente correspondido como se uma estranha força lhe elevasse os braços correspondendo, não por educação mas por inconsciente desejo partilhado e compreendido.
Seguiu-se a conversa e gargalhadas compartidas como dois colegas de escola que o espaço não tinha separado. O tempo, esse passou com a velocidade inimiga dos momentos que se querem infinitos eternamente continuados.
Tinham-se encontrado um ano anos, numa noite de chuva e, logo aí quis o destino que se perdessem por entre as brumas da ilha em paisagens fantásticas. Ele conduzia o carro sentindo os seus olhos pregados nas suas costas, o que lhe dificultava, ainda mais a condução. Jantaram entre amigos e terminaram noite dentro partilhando gargalhadas e bebendo Whisky de malte. Tinha sido lançada, sem saber a semente que germinaria naquele dia de Primavera.
O abraço da despedida continuou o já guardado e as bocas fugiram, em vão, ao beijo desejado. A música continuava o seu ritmo acompanhando-lhe os passos na partida, talvez agora de modo mais lento e triste. No fundo sabiam as notas bem mais que ele próprio parecendo cadenciar seus passos no sentido da espera.
Somente mais tarde descobriu que suas certezas tinham ficado algures entre as Hortênsias do caminho e o seu futuro selado na luz de um olhar no sabor de um beijo á boca roubado.
Somente dias mais tarde, lá do outro lado da vida e do mar, num fim de tarde da cidade grande, compreenderia a lenda que dizia que bebendo da água da montanha e dos lábios, acrescentaria, não mais deixaria de voltar. Tinha então somente uma certeza, um desejo: voltaria!

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